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oitentaeoitosim

21
Jul11

Ordálio

Jorge

 

  O homem de tez nívea escancarou a boca e disse alto e bom som, preto no branco que a maioria dos traficantes de droga tinha sangue africano ou árabe. Desabou o Carmo e depois a Trindade! As organizações pacifistas, ambientalistas e anti-apartheid disseram cobras e lagartos do indígena, tacharam-no de racista perverso e empedernido e denunciaram-no na praça pública.

   O mesmo caucasóide abalançou-se a dizer que ao patronato deve assistir o direito de recusar empregados com sangue africano ou árabe. Houve mosquitos por cordas! As organizações pacifistas, ambientalistas e anti-apartheid excomungaram-no, tacharam-no de racista perverso e empedernido e denunciaram-no na praça pública.

   O mesmo caucasiano foi presente a tribunal, acusado pelo ministério público – estribado na oratória das organizações pacifistas, ambientalistas e anti-apartheid - de racismo empedernido e outros extremismos condenados pelo Direito.

   O processo arrastou-se por muitas luas. A defesa, sem exemplo, fez depor uma fraca-figura que, no areópago, comprovou que a raça havia sido erradicada em definitivo dos anais da ciência pura e dura. A acusação, sem exemplo, fez depor um fabiano que defendeu que só os branquelos podem ser indiciados de racismo. À conta disto e doutras teses, houve muitas trocas de galhardetes em sessões à porta aberta e fechada, consoante o ditava o tempo.

   Depois veio o veredicto:

   - À uma, não fica provado que a maioria dos traficantes seja de origem africana ou árabe, posto que não há um levantamento fiável de dados neste campo. Porventura as estatísticas oficiais - regionais, nacionais ou internacionais - confirmam ser brancos de corpo e alma os donos das drogas? A sociedade civil merece que haja apuramento certeiro de números neste campo tão sensível e apaixonante da economia, paralela, perpendicular ou oblíqua que seja.

  - Às duas, não se deu por provado que o grupo sanguíneo dos trabalhadores de origem africana ou árabe seja menos indicado para a execução das tarefas imperativas, estruturais ou conjunturais, das sociedades e nações. Por acaso, os números oficiais disponíveis - regionais, nacionais ou internacionais - confirmam ser brancos de corpo e alma os melhores colaboradores das empresas? Quanto muito, admite-se a existência de um substrato genético comum aos trabalhadores, embora as pesquisas não sejam liminarmente taxativas. A sociedade civil aguarda serenamente por novos dogmas nestes domínios tão sensíveis da economia, paralela, perpendicular ou oblíqua que seja.

  - Às três, sabe-se da existência de muitos empresários com sangue africano e árabe. A nenhum deles se impõe o recrutamento exclusivo de colaboradores caucasianos. Mau seria que não pudessem contratar familiares, conterrâneos e consanguíneos. Por acaso, os números oficiais disponíveis - regionais, nacionais ou internacionais - confirmam ser brancos de corpo e alma os melhores criadores de altas produtividades, os melhores garantes de mais-valias sempre crescentes e os melhores promotores do desenvolvimento físico e espiritual das empresas e das nações? À conta do passado, dir-se-ia que não. Por via das dúvidas, a sociedade civil merece que haja apuramento certeiro de números neste campo tão sensível e apaixonante da economia, paralela, perpendicular ou oblíqua que seja.

  - Às quatro o réu foi condenado a 40 chibatadas na praça pública, a 10 dias de serviço cívico, aplicação do termo  de identidade e residência e ao pagamento das despesas do processo, por incontinência verbal pública e heresia. Caso repita a gracinha, será deportado para a Macorronésia ou Conchinchina, por sorteio ou rateio. As organizações pacifistas, ambientalistas e anti-apartheid rejubilaram e promoveram uma campanha de desagravo no ilhéu do Bugio, donde se viam muitos navios embandeirados em arco a sulcar o verde das águas salobras.

    À margem de tudo isto, houve alguns candidatos a empresários que se tramaram a valer. Haviam apostado os pés-de-meia até ao último cêntimo, na criação de parcerias público-privadas dedicadas a sangramento e transfusões de sangue. Em tempos de precariedade social, não são despiciendos os impactos de tais abortamentos nas balanças de rendimentos e balança de pagamentos, na banca, na bolsa e nas agências de anotação financeira.

 

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