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oitentaeoitosim

30
Ago10

A passo estugado

Jorge

1 - O induna disse perante a duma: - Os ricos pagam sempre mais que os pobres!

(Riram a bandeiras despregadas os tribunos, pelo que quase foram acometidos de apoplexia).

2 – O induna falou aos média: - O cantão baixou na lista dos bons pagadores, mas é normal. Fomos nós que exigimos a reclassificação. Assim estamos no lugar certo, um processo similar ao da seleção de futebol.

(De tanto espanto, os circunstantes foram acometidos de pasmos e depois de espasmos).

 3 – Diálogo irrealista:

   O prócer – Isto só vai com nacionalizações!

   O repórter – Vossência não estará lembrada que tal procedimento deu com os burrinhos na água, em tempos idos?!

   O prócer- Veja lá se me entende. O Estado comprava, limpava os cantos à casa e depois vendia barato à gente outra vez.

(O repórter experimentado foi acometido de um chilique e caiu para o lado).

4 – Notícia de última hora:

Como prova de confiança no futuro do bantustão, os titulares das profissões liberais aceitaram fazer declarações autênticas dos seus rendimentos.

5 – Dúvida metódica: Se todos os cidadãos são chamados a partilhar dívidas (muitos dos atingidos ostentam orgulho nisso), por que razão não partilham igualmente dos ganhos (muitos dos atingidos não faz reparo disso)?

6 - Naquele partido plural dominavam os destros. Os ambidestros, os hércules de Gibraltar como eram conhecidos, espreitavam a oportunidade. Os esquerdinos eram discriminados. Estes últimos apresentaram queixa nas instâncias judiciais todas. Antes da última decisão, o partido saiu do governo.

7 – Queriam dar mais poderes ao generalíssimo. Foi quando se deram conta que já não havia mais poderes em estoque.

8 – Uma trapalhada ou nem por isso: 

Cena gaga 1: O banco Caixa Forte estava nas lonas. A gerência implorou socorro. Apiedado, o regente do reino, em nome da solidariedade institucional, estendeu-lhe uma mãozinha, para o levantar do chão. O banco Caixa Forte alapou-se de mãos e braços à carteira do benemérito. O banco Caixa Forte jurou e trejurou que pagaria tudo, com língua de palmo, caso fosse necessário. O banco Caixa Forte ofereceu contrapartidas. Cena gaga 2: Chamado à pedra pelo altos poderes, o regente do reino quis a bagalhoça de volta. Aí o banco Caixa Forte tenta virar o bico ao prego: que o BCF nada tinha a ver com aquele filme, que o BCF não tinha contrapartidas aprazadas, que fosse chatear Camões, se não queria ficar a ver Braga por um canudo.

9 – E dizia aquele telespectador assíduo, quando lhe garantiram que se tinha vendido carros topo de gama como pãezinhos quentes, nos meses mais agudos da crise: afinal a crise não é para todos! (Tinha 75 anos e começava a descrer…)

10 – Outra trapalhada ou nem por isso

 O director do banco central teutónico diz que os PIGS (vulgo Portugal, Itália, Espanha e Grécia) são um perigo para a zona euro. Que são pobres, mal agradecidos e maus pagadores. Lá pelo facto de terem recebido uma farpela toda nova, nos idos do século anterior, não significa que tenham de andar sempre catitas, de corpinho bonito. Ou seja: a procura interna desses países deve situar-se a um nível sustentável. O director do banco central teutónico diz ainda que os PIGS não competem eficazmente nos mercados, mesmo no de capitais. Comportam-se como um herdeiro premiado com larga fortuna, que gasta à tripa forra e se põe a serrar presunto. Este projecto de vida tem que levar uma volta de 360 graus. Aconselha, em conformidade, que os cidadãos de Portugal e vizinhos têm de serrar os dentes, deitar-se numa cama de colchões ortopédicos - ou de pregos - e dar o corpinho ao manifesto.

11 – Um jornalista incomodado pede a um empresário acomodado um parecer sobre a economia.

J – É possível o pleno emprego?

C – Exacto, não existe!

J – É possível o pleno desemprego?

C – Exacto, não existe!

J – Ambos são necessários?

C - Tem de haver emprego qb e o desemprego bq, como sabe.

J – Emprego qb?!

C - Exacto, emprego qb, ou seja, com qualidade bastante, está a ver?!

J – Desemprego bq?

C – Exacto, desemprego bq, ou seja, em bastante quantidade, está a ver?!

J – Assim se explica o bom funcionamento da economia?

C – Exacto, por agora resolve, mais tarde logo se verá, está a ver?!

J – (Em fecho de notícia) Ou seja, vira o disco e toca o mesmo… (A peça do jornalista incomodado foi exibida no jornal nobre. Ao fundo, podia escutar-se a cantoria cujo refrão diz que a crise suporta-se, desde que não faltem os beijinhos.)

12 – Dois amigos pensam em voz alta: -

- É impossível criar riqueza dividindo-a – diz o amigo do peito

- É verdade? Mas, quem cria riqueza pouco tem para dividir, é o que se vê… - diz o amigo da onça.

- Está mal visto, quem cria é quem arrisca. E quem arrisca petisca, naturalmente – volve o amigo do peito.

- E quem petisca acaba por se encher. Portanto, os trabalhadores são verbos de encher, naturalmente – conclui o amigo da onça.

13 – Os bancos sofriam de estresse, dentro de valores aceitáveis, na sequência de longa depressão. Os curandeiros evitaram o tratamento de choque. Por magia, procederam à transmigração do estresse para a clientela.

14 – O homem pôs na praça pública um cartaz: «Respeitem o meu direito de propriedade: exijo a minha quota de oxigénio». Donos e administradores das fábricas, dos camiões, dos aviões e das centrais de produção de electricidade (entre outros) que por ali passavam inquietaram-se. Alertaram os seus mandaretes para o impacto de tal reivindicação. Estes, bem ensinados, fizeram de tudo para ocultar o protesto: construíram vedações, distribuíram rebuçados, comida Michelin e encheram-no de novos e velhos electrodomésticos. Resistiu sempre, até que abonaram o homem com uma generosa ração de garrafas de oxigénio, ao fim de 100 dias e 100 noites. Morreu então.

15 – Um jogador de futebol foi transferido, por elevada maquia, para um clube considerado de menor valia. Declarou, na oportunidade:

- Dei um passo em frente na minha carreira!

(De facto, ele acabava de mudar-se de um clube começado pele letra «p» para outro começado pela letra «z».

16 – Conversa de rua I:

- Ouvi dizer que havia uma clínica, muito publicitada, que funcionava, sem licença.

- Eu também ouvi o mesmo, nos telejornais de ontem.

- O pior disto tudo é que alguns clientes arriscam-se a ficar cegos.

- Só me espanta que os inspectores não tivessem dado com o gato!

- Consta que alguns deles foram lá operados…

17 – Conversa de rua II:

- O governo vai vender participações em empresas do Estado.

- Eu também ouvi o mesmo, nos telejornais de ontem.

- Estamos a voltar aos valores do velho ditador.

- Ora essa, porquê?

- Em calças e sapatos rotos deita-se remendos…

18 – Conversa de camioneta:

- Fala-se em quotas para jovens nas listas eleitorais.

- Eu li isso na Net. - Acho lógico, se havia quotas para mulheres, será justo chamar à política a malta jovem.

- Prevejo que se sigam as quotas para adolescentes e bebés.

- Estás a mangar comigo. Esses não votam!

- Mas sabem fazer figura de corpo presente…

19 – Conversa de cabaré:

- O senhor Kagame, candidato a presidente do Ruanda, ganhou as eleições com mais de 90% dos votos.

- Eu li isso na Net. - Acho que ele nem se esforçou muito durante a campanha.

- Como sabes disso, tu nem sabes onde fica o país?!…

- À primeira borrada, os eleitores vão querer corresponder ao convite...

20 – Conversa no metropolitano:

- O caso Freeport parece-se cada vez mais com uma caldeirada.

- Não estou a acompanhar o teu raciocínio.

- Já comeste caldeirada sem batotas?...

21 – A lógica não é batata: A PT fez um grande negócio e não pagou impostos. A UE, no caso de transacções não imóveis, de poucos ou muitos cifrões, aplica a lei sobre empresas mães e filhas: trocam dividendos entre elas e nada pagam. Nas doações e heranças, entre indivíduos, o Fisco também não bica nada. Tudo dentro da lógica da legalidade, portanto.

(Quem não sabe ser caixeiro, que feche a loja…)

22 – Conversa de táxi I:

- O país está ao rubro.

- Não me parece.

- Pois, os média só falam nos incêndios.

- Ah bom! O campeonato de futebol ainda não começou, pois não?

23 – Conversa de táxi II:

- Há quem defenda a ideia que os pirómanos deveriam ser apanhados e julgados rapidamente. Eu concordo.

- Pois eu não. Acho bem que sejam todos, mas todos apanhados. Agora julgados rapidamente não!

- Não entendo...

- Deixem a Justiça seguir o seu ritmo, que eles nunca mais saem da cadeia…

24 – Terradas:

i - Saiu de casa às 7 da matina. As filas para aquisição de títulos de transporte estavam muito longas. Persistiu e chegou-se à frente. Quando chegou finalmente à praia, o dia tinha expirado.

ii – Ele foi festejar o conclusão do curso. Entrou na casa de pasto, com amigos, e comeu que nem abade. A conta era longa, muito longa. Conferiu de trás para a frente e vice-versa; tirou a prova dos nove. Voltou à rua e deu-se conta que o jantar estava à porta. Regressou sobre os seus passos e pediu de jantar.

iii – O barco partiu cedo. Foi quando se deu conta que os passageiros eram mais que muitos, a lotação estava excedida por larga margem. Fundeou a meio da larga desembocadura do rio. A maioria dos passageiros aguardou por alternativa que só chegou ao fim da tarde. Os que sabiam nadar foram os únicos que trabalharam nesse dia.

iv – O homem recuperava fogões a gaz numa cave de um prédio de habitação. Um dia declarou-se um incêndio na oficina não institucionalizada, mas socialmente aceite. Apenas o condómino do rés-do-chão ficou para reclamar o prémio às companhias de seguros. No momento da explosão assobiava para o lado.

v – O pavimento da rua estava roto de tanto trânsito. As marcações já não se viam, porque a tinta havia levado sumiço. Quiseram abandoná-la. Dois anos depois, vieram uns senhores e puseram-lhe remendos de alcatrão e tinta fresca: a rua passou de novo a ser a mais frequentada.

25 – Conversa de avião I:

- As praias de nudistas vão acabar.

- Porquê? - Os nudistas fartam-se de levar a areia para as suas casas.

26 – Conversa de avião II: - Os profes já não andam na rua, em manifestações.

- Porquê?

- Estão contentes por serem avaliados.

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