- Zé, vai à janela e diz-me o que vês.
- Um mar de gente, chefe.
- Quantos?
- Largos milhares, chefe.
- Gritam, apupam e chamam-me nomes feios?
- Vão a caminho do estádio da bola, fazem um charivari dos demónios e gritam impropérios, chefe.
- Lindos meninos, assim-é-que-os-quero, reguilas, mas coactos, sem deixar pupu fora do penico!
- Gritam contra a federação, contra os árbitros, contra os simpatizantes do adversário e contra a mãe deles, chefe.
- Melhor que isso, só as marchas-ó-filambó, o doce pipilar dos rapsodos românticos e similares e as práticas animistas.
- Assim é, haja quem mande e muitos mais que obedeçam, chefe.
- Liga-me ao Macedo.
- Está tudo a correr sobre esferas?
- Tudo como os anjos na paz de deus.
- Alguma receita especial para o dia de hoje?
- Não o acompanho… Ah! Bastou pôr nas ruas uns quantos com colaboradores de viseira, bastão, olhar durão, pé e mão ligeiros.
- Aos díscolos estúrdios dá-lhes que contar, mesmo que sejam todos!
- Não o acompanho … Pois sim, porrada nos que refilarem, tá garantido pela constituição e até o Tribunal Constitucional nada diria.
- Lagarto, lagarto, fecha a matraca, Macedo!
- Por quem soides…
- Liga-me ao Maduro, o de cá, não o bigodudo da Venezuela, topas?
- Portaste-te à altura no briefing, ó maçarico, sorte de principiante, não achas?!
- Quer que faça um lifting, vou já tratar disso. Nas pudendas partes ou no espinhaço?
- Ouve, não brinques em serviço, já bem bastava do teu antecessor a metade…
- Sou todo ouvidos, mas antes, deixe-me aqui abrir mais uma porta. Pronto, obra feita, chute!
- Vê lá como falas. Só para confirmar, lá no briefing, falaste em consenso com aquela gentalha do largo do Rato 9 ou 12 vezes?
- Acho que foram 9+3, à dúzia é mais barato.
- Altamente, em tempo de crise, o barato é bom, seu malandreco!
- Conseguiste fechar-te em copas e não falar da porrada que a gente preparou no corrilho. Espremeste-te bem, aprendeste mais depressa que nas novas oportunidades, irmão!
- A minha boca é um moimento, quando é preciso. Agora vou ali empurrar mais uma porta. Acha que posso ser um novo Santana, chefe?
- Alto e pára o baile, para derriço, basto eu e só faço olhinhos de carneiro mal morto à patroa, que fique bem entendido!
- Já cá não está quem falou…
- Liga-me ao Tó, Zé.
- Alô, daqui é do inimigo, podia chamá-lo?
- Não tenho tempo para perder com brincalhões. Tenho mais uma carta escrita, para ti, cara bonita, não tenho por quem a mande.
- Ó Tó estavas a escrever para mim, mas que subida honra!
- Lê e vê se te consolas, estive a copiar Bocage e logo vês como elas te mordem!
- Ó amigo de curta data, vamos tomar um shot que logo te assume a vontade dos consensos.
- Consenso a tua tia, andaste a falar com a troica, com o tipo dos submarinos e com o padeiro, antes de mim e só queres terminar o mandato!
- E não me venhas com essa treta da fome, que no meu sacrificado país não há fome, óviste.
- Andou uma pobre mãe a criar um filho para isto! Sabes que mais, vai lá ver se chove na eira e se há sol no nabal!
- Então, até já, ó magano, nunca me enganaste.
- Liga-me ao Demétrio.
- Diz-me lá rapaz, como estão as estatísticas?
- Reformas: 1001; medidas de austeridade: 50 medidas de austeridade (as mesmas, para os mesmos); défice estrutural e o nominal: 500 melhorias, cantinas sociais: quase 1001 (só 62, em 2011, que vergonha!); mortos à revelia das medidas do 1º programa: incontáveis; humilhação, frustração e desespero, idem.
- Tudo razões para querer continuar, não achas, Zé?
- O tempo está melhor, de facto, chefe.
- Liga-me aí à Ângela.
- Meine liebe, achas que posso mandar malhar nos fanáticos amantes da bola, continuar com o Maduro, falar com o Tó e dizer que a gente está bem nas estatísticas?
- Ó quiducho e interrompes a minha sessão de fotografias oficiais, por questões de lana caprina?!
- Entschuldigung, mas não seria melhor que o seu parlamento se pronunciasse?
- Ja, mas agora, ó seu filho das malvas, desampara-me a loja ou põe-te à caça de gambozinos com a tua pandilha, num mínimo durante as próximas 11 horas, fazes de sendeiro, que para cão de fila reprovas de certeza. Próxima foto!
- Vês, Zé, sempre disponível para ajudar,
- Mas ele deu-lhe com os pés, chefe.
- Não te acompanho, ó gusano
- Já cá não está quem falou, chefe.
(Silêncio sepulcral, só interrompido por acordes de músicas derramadas da voz de Tonicha, «Não vás ao mar, Tonho», e «Tu és o Zé que fumas», em particular, ao fundo)