Manife
Eu ontem fui para a rua protestar, mas ninguém me ligou nenhuma, nem sequer o ministro das prisões que se passeava com um sorriso pepsodente que ninguém entende. O homem sofre mesmo de uma insuficiência nos maxilares. Se o riso genuíno demora mais que 3 segundos, os músculos da cara prendem os maxilares e o homem fica para ali com aquele ricto larval e alvar estampado nas maçãs do rosto, como se o siso o tivesse abandonado, mas não é assim. Nem ele, nem a malta que o rodeava, só seguranças eram para cima de 50, passou cartão aos meus cartazes. A cadeia é nossa, Quem a fechar mete o pé na poça, Os nossos presos ficam ao pé da gente, andar 10 km para os ver deixa a gente doente, Querem o bairro encerrado, Já voltámos ao passado.Tinha estado a tarde anterior a puxar pelo bestunto e saíram-me aquelas rimas, só que me esqueci de mandar sms e botar recado na net que eu ia organizar aquela manife, por isso só um meu meio-irmão e uma prima afastada me acompanharam na faina, mas sem compromisso. Nisto, vem uma representante da autoridade a saber dos papéis. Mas quais papéis, senhora guarda, eu sou móvel, mas não automóvel. Não sabe que tem de ter licença? De quê, de caça, pesca desportiva, pesca em Cacilhas? A agente até era uma carinha laroca, mas não achou piada nenhuma, sobretudo a referência à terra dela. Levou-me para a esquadra, onde me deram de comer camarão à guilho, regado com um reserva verde de alto lá com o charuto e , a finalizar, claro um charuto. Pediram-me desculpa pelo chilindró não dispor de televisor 3D. Homessa, vê-se bem nesta chata de grande ecrã. De resto era tudo do bom e do melhor, mármores de Carrara, ar condicionado portátil, colchão de água, tapetes de Arraiolos, que sei lá eu. Conversaram comigo uns 4 agentes, ao ritmo de pancadinhas nas costas e da música dos pauliteiros de Miranda. Confesse-lhes que tinha participado nas manifes, aquando do encerramento das 3 escolas primárias do bairro, da estação de medição da qualidade do ar, da esquadra da GNR, dos CTT e das sentinas público privadas, sem que tenha sido preso. Não reagiram, quando 5 filiais dos bancos fecharam portas, porquê. Não, na vida dos privados a gente não se mete. Forcei mais a minha sorte, quando lhes disse que havia de caprichar nos protestos contra o encerramento da sede da junta de freguesia, marcado para breve. Ia ser tudo do bom e do bonito, à maneira, com avisos na net, nos placards publicitários eletrónicos e fixos, nos telemóveis, grafitis e com autorizações e taxas respetivas em ordem. Não me deram ouvidos e puseram-me no olho da rua, pela alvorada do dia seguinte, sem ter visto o Sol aos quadradinhos. Depois de um pequeno-almoço opíparo, saí, sem cartazes, mas sob protesto.