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oitentaeoitosim

02
Jun13

Joaninha sofre de nubécula, não a tomem por abécula

Jorge

  Joaninha migrou para Lisboa, por conta (ao que consta) do 1º prémio na lotaria, no euromilhões, no totobola, no totoloto, no joker, nas raspadinhas e pôs-se a governar a fortuna sozinha.

  Gastou à tripa forra vinténs e cabedais, quais subsídios da união dos serviçais, em artigos necessariamente espúrios, como garantia da sua ascensão. Esmerou-se na aquisição de vivenda de arremelgar o olho a qualquer zarolho.

  Num dia de suão, rodou a carmona, apartou as lindeiras da janela do rés-do-chão e pôs-se em saracote e decote, a apreciar quem passava, com gosto de escanção. De mãos ajustadas à cabeça, vê passar um peão, junto ao torreão.

- Quem quer coabitar com a Joaninha que garante cama roupa lavada e boa vidinha, por 4 anos?

  O transeunte nem tuge nem muge.

- Ó tu que fumas, alinhas ou deitas fora 4 anos de venturas inenarráveis?

  O homem tira as mãos da cabeça, para que ela lhe descubra a careca.

- Eu sou João e vou de peregrinação por esse pobre mundo de Cristo fora. Não me venhas com batatinhas, pois sofro de tinhas e assim sendo não tenciono ir comer-te à mão. Contento-me com 2 montados, pão de sêmea e o conforto da minha alma gémea.

- Vai, vai que tens a voz e a casca grossa, t’arrenego!

- Vai-te catar, ó dengosa, volta lá para o sítio que te viu desabrochar!

  (Pôs-se na alheta, no piro e na piroga, não fosse aquela uma sereia pronta a atacar, munida de bolos e zaragatoa de afracar.)

  Muitas luas depois, vê passar um calmeirão agrisalhado, charmoso, com ar de quem, ponderoso, ensaiava a próxima catilinária.

- Ó príncipe encantado, ponho-te de casa e pucarinho e pensão completa, por 4 anos, basta que te chegues a este recanto e te abandones ao meu encanto.

  O andante fez menção de ir logo adiante, nem chus, nem bus.

- Alinhas ou dás à soleta?

- Já que insistes, ouve-me bem: eu sou João e vou em peregrinação a santo lugar e deixei companheira e rebentos a chorar. Sinto raiva e mágoa, mas não é contigo que as vou prantear. Para que vivas do ar, eu e muitos como eu têm que operar.

- Deixa-te de lérias, és danado para pilhérias! Penetra-me as propriedades, onde poderás disfrutar de todas as minhas concavidades e convexidades, que ainda estás para as curvas.

- Vai antes tu dar uma curva ao bilhar grande e deixa de catrapiscar o olho, que te topo à distância, sei que te fias na alternância! A bem ou a mal, escolhi a demanda do graal. Quando menos te precatas, levas de chibata!

 (O ex-candidato, escuma, sai apressado em direção à sua escuna, pois levantara-se mau tempo na laguna.)

  Algumas luas depois, passa um fabiano com ar de arcanjo e topete de macanjo.

- Ó marujo, quereis embarcar? Tenho do melhor para te dar, se comigo vieres 4 anos a coabitar…

  O passante, cara chapada de Maquiavel, exibe os modos de quem vive em eterna lua-de-mel.

  - Eu sou João e vou em peregrinação à terra da perfídia, mas disponho de todo o tempo deste mundo para falar de santas alianças e outras jactâncias. Vou mudar de farpela e junto-me a ti na janela.

- Tiro e queda e eu para aqui preocupada que ninguém me pegava.

- Dou-te a mão, jantamos à luz das velas, tentamos umas manobras de diversão, de resto roda livre; juntamos os trapinhos, mas não queremos filhinhos.

- Bem caçado, marmelada e trapalhada têm hora marcada. E também te ocupas dos trabalhos colaterais, certo? Já aí vamos dar uma volta aos meus ferregiais.

- À boda de estadão, traremos a nação; enquanto durar a lua-de-mel, faremos grande aranzel. Nos tempos de ócio, tratamos dos negócios.

   (Enquanto o mafarrico esfregava um olho, ficou tudo tratado, embarcaram num submergível e não se cansaram do sonar, de consoar e consonar debaixo de água.)

   Algumas luas depois, sobreveio o nojo e Joaninha não dá sinal de amojo. Volta à janela de estimação e quase lhe salta o coração no peito, de tanta emoção. Possuída de fornicoques, à passagem daquele adónis de cabelo anelado e papelotes, não se conteve:

- De olhar para ti quase sucumbo. Fico de pés à campa, só de pensar que me vais dar tampa. Sê patriota, vamos à cambalhota!

  O viador arremelgou os olhos, limpou as lentes e incontinente, desfechou:

- Mas, que vem a ser isto, uma mulher casada a jogar ao assédio eu não concebo?! Sou João, mas sou alguém e não ando aos caracóis, nem me meto em lençóis por dá aquela palha, sua desbocada gralha!

- Por quem me tomas, sou uma mulher casada, mas não esgotada! Tenho ainda muito carinho para dar e estou devidamente autorizada a sobraçar a quem, nas horas vagas, tenha  amor para dar.

- Gostas de coisas de farta-velhaco, uma ménage-à-trois, quem sabe? Sinto-me contente com  o convite, mas não competente para o abafar. Põe-te a milhas, ou muda de pilhas!

- Alinha, quiduxo, ali atrás daquele buxo!

- Do sério me tiraste, eu que me propunha com todo o vigor arrimar-me aos tirantes do andor. Que seja pelas almas do purgatório, que por tal acreditar apodam-me de simplório. Uma vez só, sem exemplo, tu e eu já temos idade para ter tento.

   (Palavras ainda não eram ditas, embarcou à sorrelfa, no bote o bonitote e foi um fartote; mais tarde queixou-se de dispepsia, a quem o ouvia.)

  Algumas luas depois, nova viagem, que a vida não fia em paragem. Um belo dia, Joaninha troca olhares furtivos com uma tríade de mariolas, daqueles que têm toda a escola, estando ela de plantão e muita gente não.

- Ó distintos mandarins, vinde a mim e nada vos faltará, em 4 anos vamos de kama-sutra e em charola, até que saiam de padiola.

  Os passageiros ladinos, aperaltados nas suas pastas e computadores de trazer à mão, estancaram e logo foram ao beija-mão.

- Somos 3 Joões. Querer organizar uma bacanal?

- Uma orgiazita chega. Sou uma madama à moda antiga e resigno-me às coisas simples da vida. Dou as piruetas que bem entender, por estar licenciada. Compartam, não sejam marretas.

- Barba-azul gostar de pedrarias e honrarias. A gente faz aí dentro acerto, a céu encoberto.

- Tomai-me e recebei e tudo ficará por conta do bei. Sejam bem-vindos à humilde casa desta madama que toda se esgadanha, por andar em brasa.

  E foi um fartar vilanagem, com eflúvios de rave, vapores etílicos e sexo bravio. Um belo dia ouve-se um baque surdo e logo cheira a esturro. Estando de perna-para-o-ar, um tremor infausto atirou o catramonho exausto, de tanto repasto, a um caldeirão fervente da arrecadação. Ainda lá estão.

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