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oitentaeoitosim

14
Mar14

Cenas do País Tetragonal (XVIII)

Jorge

O Governo em Funções (GF) sofre da síndrome da ludomania: está entregue de alma e convicção a jogos, do duplo ao cénico, passando pelo de cintura e aos de sorte e de azar, vai a todas, mas sempre dentro das margens da licitude. Para matar o tempo, pois as tarefas a cumprir são cada vez mais monótonas, estilo atar e pôr ao fumeiro,  cortar e dourar a pílula e não passam disto.

(O síndroma de burnout seria mais preocupante.)

O GF começou por dirimir jogatanas sectoriais, com boa % de sucesso, refira-se: esconderelos, com os magistrados do topo da pirâmide judiciária, monopólio com os contratadores e comentadores de sucesso e a apilhagem e o pau com os ursos, com o maralhal.

(Bons resultados em passatempos frustes, dão moral.)

O GF, desde a sua conversão à  equanimidade social, entra numa fase de reinação. Quer que todos a entrar na dança da salvação. Um dos seus membros sugere duelos, espetáculos de roleta russa ou mesmo torneios de coliseu.

Ninguém estava para aí voltado, os restantes fazem-lhe negaças e depois leva nega.

(Os tempos estão para punhos de renda, não de virga-férrea.)

O GF reúne em conciliábulo, num fim-de-semana alargado. Sobre a mesa uma proposta de vulgarização do jogo em Bolsa. Chovem esquissos de pagelas e vulgatas sobre o assunto, mas o anteprojeto morre na casca.

«Isto não é para todos, que não se trata de jogar a feijões!» - com esta tirada que peca por tardia, o ministro da Fazenda arruma a questão.

(Ele fala inglês, russo, castelhano e italiano, por isso impõe respeito.)

Ato contínuo, saca do parecer de um ilustre representante de uma casa de advocatura, de um estudo levado a cabo por um grupo de missão e ainda de um relatório de um grupo sigiloso de inteligência, todos acabadinhos de sair do forno: um a um recomendam tento na língua e nos atos: se muita agente se deixar enfeitiçar pela nobre arte da traficância de ações e derivados, a cobrança de impostos iria ressentir-se, o desemprego aumentava e por-aí-fora, só desgraças!

Ninguém joga de cristas. Pronto, não se fala mais no assunto, se não vai haver jogos de tabuleiro, nem daqueles para homens de barba rija, avance-se para um sorteio. Ninguém sai chamuscado, é democrático, sai barato e dará milhões ao erário do público…

Palavra puxa palavra e lá nasce a fatura da sorte, guindada a desígnio nacional.

(Sortear é mais digno que rapar.)

Os cidadãos, do mais cumpridor ao mais relapso, preparam-se para o sorteio semanal, treinando a caça aos cupões, numa reserva adrede a um parque natural que já tem os dias contados, mas onde ainda florescem espécies indígenas altamente reputadas nos países de destino das exportações.

Esperem até ver as ruas povoadas de cidadãos de cabelos floridos, a espelhar e espalhar o amor.

(Os jogos infantis são graves ocupações, apenas os adultos brincam. Às vezes com o fogo e depois formam-se as cortinas de fumo.)

 

 

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