Contos de fados (XIII)
- A justiça não é igual para todos, é preciso denunciar.
- Desminto categoricamente, no papel e na teoria todos somos iguais. Mais direi, a justiça nunca deixou de ser igual para iguais.
- A justiça é cara, urge atuar.
- Totalmente em desacordo, tudo tem o seu preço certo. Toda a gente pode contratar um bom causídico, independentemente do pé-de-meia adregado e agregado. As entidades financeiras, os familiares e amigos são para as ocasiões.
- Não há pai para advogadas e advogados, assim não pode continuar.
- Não é bem assim, quem manda pode e quem pode manda. Elas e eles podem e dão-se a algumas veleidades do mando. Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte…
- O Estado deveria chegar-se à frente e não fiar-se tanto nas boas graças de S. Ivo.
- Não está a ver bem a coisa, os bons dos causídicos apenas se desenvolvem em privado, a iniciativa privada gosta deles. Portanto, não meta o Estado o nariz onde não deve, em nome da sã competitividade social, logo do bem-estar geral. A cada santo seu círio!
- De médico, advogado e padre cada qual tem um grande bocado.
- Discordo, de leis o mais vulgar é haver desconhecimento. As decisões favoráveis obtêm-nas todos quantos melhor interpretem e convoquem os espíritos das leis.
- A justiça tem sete mangas e em cada manga sete manhas.
- Discordo, quando muito justiça não é só lei, requer uns pozinhos de espírito inventivo, como noutra profissão e é assim que o mundo pula e avança.
- Se calhar põem-se os juízes a inventar…
-Não coloque palavras na minha boca! Qualquer juiz atém-se à letra da lei, para tanto lhes paga o Estado p, para serem equânimes.
- Se calhar põem-se os agentes do Ministério Público a inventar…
- Discordo o suficiente, para não estar de acordo, pela busca objetiva de provas, já sobram bastas vezes, aos seus agentes, profícuas provações.
- Quem nos dera que a justiça terrena fosse infalível como a divina, deus escreve direito por linhas tortas.
- Quem sou eu para discordar?! Aos humanos é também dada a possibilidade de escrever torto, por linhas direitas.
- A justiça é mesmo cega de nascença?
- Não consigo ser imparcial, não lhe acompanhei os primeiros passos.
Assim cavaqueavam Teobaldo, um émulo do Zé do Telhado, e Querubim, um advogado do diabo, à porta da domus iustitiae.
Entrementes, chega um plutocrata a bordo de uma chaimite. Vinha acusado de ter desgraciado muitas existências. Tomado de súbito e lancinante estupor, o argirocrata claudica e estatela-se ao comprido, quando fina adaga lhe atravessa o ventre, expelindo o último suspiro.
Na versão oficial, posta a circular, transcorridos 2 minutos sobre o infausto acontecimento, o indivíduo tinha executado haraquíri inopinado e inconcluso.
Atenção que já não é de bom timbre ajustiça feita por mão própria.