Escravismos d’agora
Da dor todos somos escravos.
Aforismo
I - A revista «Sábado», no seu nº 693 (10-16 de agosto de 2017, como o tempo passa!), pela pena da jornalista Catarina Guerreiro, apresenta 3 denúncias de escravaria, em Portugal, perante os quais muita gente sentiu muita pena:
. Na Vidigueira, foi denunciado que imigrantes do leste da Europa faziam trabalho escravo na apanha da azeitona: mais de 80 ficavam numa oficina, outros 30 num apartamento, com homens e mulheres misturados
. M.A. cuidou de um casal e do filho deficiente, tratou da horta e dos animais, fazia as refeições, arrumava, limpava e quase não saía de casa. O filho e o marido morreram e ficou a cuidar da dona de casa (uma senhora à moda antiga), falecida aos 99 anos de idade. Nos últimos 20 anos, trabalhando nestas condições e sem folgas, recebia cerca de 150 euros por mês.
. Numa embaixada, R. era insultado, tinha de trabalhar sem limite de horas e sem tempo de descanso. Não tinha autorização para sair, na maioria dos fins-de-semana inclusive (casos similares ocorrem em várias embaixadas e missões diplomáticas.
A senhora merecia que os abusos e outros similares tivessem conhecido um fim.
II - No mesmo nº da revista «Sábado», no mesmo artigo, a mesma jornalista, Catarina Guerreiro, dá a conhecer, com a força de dados, muitas outras situações que apontam ao mundo, perante os quais muita gente sente muita pena:
. Na Índia – as castas tornam a injustiça uma coisa divina, segundo Arundhati Roy - o pó de mica, mineral que dá brilho a maquilhagem e tintas de carros é extraído por 20 mil crianças, na Índia, um país de castas (,) e com 18 (ou 14?) milhões de escravos.
. Na R. D. Congo, 873 mil escravos são, sobretudo na extração de tântalo, muito usado no fabrico de computadores, leitores de DVD e telemóveis que nós consumimos na maior (são ameaçados por militares armados de facas e pistolas).
. Na China, 3,3 milhões de escravos chegam a trabalhar 300 horas por mês, na produção de roupa, flores artificiais, calçado e produtos eletrónicos.
. No Uganda, 244 mil escravos labutam na composição do carvão usado em grelhados, noutros países. Alguns estão ligados ao cultivo de chá, café, tabaco e arroz.
. Costa do Marfim e Gana controlam a produção de chocolate – 70% é feito por escravos.
. No Bangladesh, 15 mil crianças escravas enrolam cigarros à mão.
. Na Mauritânia o problema põe-se com mais gravidade (4% de população vive em regime de escravidão).
A senhora não merecia a desfeita de saber que muitos destes abusos e outros similares (a bem do negócio) se mantêm.
III – Não anda com muito tempo, uma notícia deva conta que muitas pessoas em fuga da Líbia eram feitas escravas por traficantes e aí muita gente sentiu pena.
Na ocasião, um jogador de futebol, o senhor Geoffrey Kondogbia, nascido na República Centro Africana e a jogar por um clube de Espanha, no fim de um jogo em que marcara 2 golos, exibe numa camisola interior este dizer: «eu não estou à venda». No Twitter, o centrocampista reforçaria a denúncia: «A rebelião está em movimento. Apoio as pessoas exploradas na Líbia».
(Sabe-se que a mensagem expressa na camisola interior, completa, rezava assim: «Fora do futebol, não estou à venda».)
Mal-amanhada, a denúncia foi feita; o senhor merecia ter tido muitos mais seguidores, por mim falo. De mãos atadas, mais facilmente nos invade a dor, ou o estoicismo...
A escravatura (ainda) é uma triste realidade nestes países.