Manojo
Manojo era muito dado, por acaso, a cãibras, com as quais sofria pra burro, vítima das aguilhoadas que o deixavam transido de pânico, vezes mais que à conta.
Se fazia footing, as malditas dores materializavam-se lá para o fim da sessão. Se corria a caminho do laboratório, seu local de trabalho, as contrações espasmódicas faziam-se notar à entrada, para gáudio do chefe nhurro que já o ameaçara com despedimento por justa causa.
Pelo-sim-pelo-não, fazia questão de manter um saldo positivo individual, no banco de horas da empresa.
Nos momentos mais íntimos é que era mesmo chato, coa breca! Chegou a ser acusado de inépcia, egocentrismo, de ejaculação precoce e até de orgasmos múltiplos não retribuídos.
As cãibras atacavam, estivesse de pé, sentado, deitado ou levitado, a belo talante delas, sempre que lhes dava na veneta, quantas vezes à falsa fé...
Socorria-se de medicamentos, mezinhas, dietas e até orações, para fugir às ferroadas da maleita, mas as danadas eram recalcitrantes!...
Naquele dia, correu para o estádio a tempo de ver o início do jogo de futebol entre 2 clubes do campeonato máximo do futebol da terra, um dos quais era o seu favorito. Mal se sentou, ei-lo, inteiriçado, agarrado à perna esquerda. Alarmaram-se amigos e vizinhos, mas pediu-lhes que não se apouquentassem, era só mais um pequeno episódio de cangueira, que já passava. Friccionou a perna a preceito, contorceu-se segundo o catálogo das boas-maneiras, mas deixou escapar um ou outro ricto embaraçoso. Pronto, já passou!
Não tardou um segundo episódio, um ferrão que lhe incomodou a perna direita.
Então, lembrou-se da banana que trazia no saco. Uma banana, sobretudo se amadurecida à força, tem o condão de temperar as cãibras, sabia-o por experimentação própria.
Aberto o saco, agarrou-se à banana, de forma tão atabalhoada e canhestra e ei-la que toma altura, uma dinâmica de projétil. Incrédulo, de olhos esbugalhados, seguiu-lhe o trajeto até ao relvado, onde aterrou junto ao quarto de círculo, aos pés de um atleta da casa - também ele apertadinho por uma cãibra malquista – que se aprontava para bater um pontapé de canto.
O dito atleta, tomado de homóloga convicção (sobre as virtudes terapêuticas da fruta da bananeira) não se fez rogado e chamou-lhe um figo, num abrir e fechar de olhos.
Houve um chuto de trivela (coisa que nunca operara) e o esférico entrou direto, ultrapassando o especado e atónito guardião adversário que se tinha revelado ladino e felino até então.
Foi o único tento da partida e teve importância acrescida no desfecho da competição.
Do estádio, Manojo saiu em braços e em ombros.
As artes e ofícios bananeiros e correlativos prosperaram.
Manojo voltou-se para a meditação, que as sacanas das ferretoadas duram e duram.
(PS: Cabe dizer que o jogador sortudo foi admoestado pela entidade organizadora, pela atitude pouco higiénica de ter atirado a casca da banana para o chão; foi igualmente multado pela entidade patronal, por infração a normas internas que impedem a ingestão de alimentos a desoras.)