Tabaréu
Um senhor dengoso mete-se na cama de uma donzelona perliquitete que o chama de gatão e acha charmoso. Nos prolegómenos, há lugar a uma ceia de lambança, com muito manjar-branco, muitas libações e muito gabanço. Fazem amor e tudo o mais que lhes dá na real gana, o que os mantêm entretidos em vale de lençóis, a noite completa.
Ao dealbar, o senhor estremunhado estranha o ambiente e os cheiros que matizam o ar. Logo lhe ocorrem todas as miudezas da surtida noturna por terminar, tendo por certo e sabido que a sua companheira de longa data não haveria de achar piada ao arranjinho que tresanda do gualdipério. Depois de breve exame de consciência matinal, uma prática hígida para quem se quer manter à tona de água, após as manobras de higiene pessoal e de uma refeição reparadora, saiu porta fora leve que nem um passarinho, sem dizer ai, o que deixou pesarosa a nova candidata a dona do seu coração. Nada que não se possa compor com uma mensagem ardente para o contacto secreto, daqui a nada…
O senhor instala-se no seu birô, olha como-quem-não-quer-a-coisa para o montão de hebdomadários, para descobrir que a sua efígie e a da venturosa companheira ocasional de tálamo estavam escarrapachadas em todas as primeiras páginas. Não se aventura na leitura, antes alvitra as reações impressas, que não passa de um sem-vergonha, que não pode ver um rabo de saia, delambido, fraldiqueiro, femeeiro, traidor, um chorrilho de anátemas. Para a companheira sobrarão muitos mais epítetos, estilo bandarra, bruaca, cação, croia, zabaneira, ejaculadora contumaz, enamorada de josezinhos e outros comentários soezes, estilo, que dava trela e cibo ao padeiro, ao jardineiro, ao motorista e ao coveiro, promotora de gualdipério e vira-que-trambulha, dando de barato o ferro de muitas mulheres que ajudaria a ampliar o som e o tom.
Chama a despacho os seus colaboradores mais próximos e tudo desliza sobre carris, sem qualquer frémito ou estrépito, num ambiente de elevação, facto muito estranhado por alguns e entranhado por todos. A alegria no trabalho é ambição universal e agora acontecia ali, a todo o instante.
Num intervalo para café, uma mão furtiva dispôs, como-quem-não-quer-a-coisa, em primeiro plano a primeira página de um jornal e ele dá-se por achado: «Parabéns, presidente, conseguiste!» - reza a cacha.
De facto, lembra-se agora, tinha conseguido o primeiro orgasmo decente, ele que é tido por padecente inveterado de disfunção erétil.
Haveria de livrar-se da hipocondria também, um dia destes e outro galo cantará…